INTRODUÇÃO
O Transtorno de stress
pós-traumático (TEPT) está relacionado a um evento traumático, como vítima ou
testemunha com noção de morte, que gera uma resposta fisiológica intensa que perdura
por mais de um mês e que haja uma predisposição.
Os estudos iniciais datam de 1936 e foram feitos por Hans
Selye. Descreveu a Síndrome de Adaptação Geral com três fases: alarme,
resistência e exaustão. Foram retomados de forma mais marcante após os
acidentes com os atentados de 2001 contra o World Trade Center, o tsunami na
Tailândia em 2004, o furacão Katrina em 2005 e o pós-guerra do Iraque,
Afeganistão e Paquistão.
O termo estresse foi tirado da física para denotar um estado
do motor de um avião que não pode mais voar devido ao desgaste do motor.
Envolve uma condição de exaustão física e psíquica. Geralmente
seu portador se esforça por continuar devido a críticas de terceiros e de si
mesmo para consigo, se esforçando para a realização de suas tarefas físicas e
psíquicas. Esse esforço continuado, como se tivesse empurrando um carro na
subida, leva-o a exaustão.
O trauma pode ser decorrente de um acidente de
carro, um diagnóstico médico grave, uma cirurgia, um assalto, um sequestro, uma
tortura física ou mental, uma separação traumática, uma perda de ente querido e
outros.
Diagnóstico
A. Sonhos traumáticos repetitivos;
B. Flashbacks de lembranças traumáticas intrusivas na vida
diurna;
C. Afastamento de estressores ambientais anteriores e novos.
Sintomas secundários: baixa da
imunidade, lentidão de raciocínio, perda de memória, lacunas de pensamento,
falta de concentração, distúrbios do sono, constipação intestinal, diminuição
da libido, andar lento, fala lenta, desfalecimentos, medo de ficar só ou de
sair de casa. Ocasionalmente aparecem sintomas de excitação e psicóticos.
Esses últimos podem levar a erros de diagnostico, como Esquizofrenia
e TDH.
Epidemiologia
Estima-se
que 50–60% das pessoas irão passar por uma experiência traumática como as
descritas e que 8% irão desenvolver o TEPT. Tenho minhas discordâncias diante
da frequência desses pacientes em meu consultório, geralmente com diagnósticos
de depressão refratária, Transtorno de atenção e Transtorno de humor bipolar.
Predisposição
Conclusão: um trauma anterior é
necessário para o desenvolvimento do TEPT.
Stress Disorders, Post-Traumatic Arch Gen
Psychiatry 2008; 65(4):431-7.
Patogenia
Uma abordagem da neurociência para entender o TEPT e a
predisposição
Estudos
mostram duas áreas do cérebro sensíveis ao estresse: o hipocampo, importante
para a memória e o córtex pré-frontal, envolvido no raciocínio e tomada de
decisão. A ressonância magnética funcional, que monitora o fluxo de sangue no
cérebro, revelou que, quando as pessoas que têm TEPT são lembrados do trauma,
elas tendem a ter um córtex pré-frontal desativado e uma amígdala hiperativa.
As
pessoas que sofrem de trauma, mas não desenvolvem TEPT, por outro lado, mostram
atividade maior do córtex pré-frontal. Estudos mostraram que esses indivíduos
resilientes têm conexões físicas mais fortes entre o córtex e o hipocampo. Isto
sugere que a resiliência depende em parte de comunicação entre o circuito de
raciocínio no córtex e o circuito emocional do sistema límbico.
Stress Disorders, Post-Traumatic Neuron
2008;56(1):19-32.
Caso clínico
M era professor universitário aposentado e havia dirigido
vários órgãos públicos. Foi sempre ativo e enérgico. Estava com 67 anos.
Dois
anos após a aposentadoria começou a apresentar tremores dos dedos das mãos,
espasmos ocasionais da musculatura estriada da face, sintomas de depressão sem
antecedentes na história pessoal e quedas repetidas ao solo sem perda da
consciência.
O neurologista fez o diagnóstico de Parkinson, mas não
encontrou explicação para as quedas ao solo, apesar da completa propedêutica
neurológica.
Após
uma dessas quedas, foi detectado um hematoma na região occipital e submetido a
craniectomia.
Três meses depois continuava com as quedas ao solo, tornou-se
estranho com os familiares e com o trato com dinheiro. Só gastava o necessário
e não confiava no banco, onde deixava o mínimo de dinheiro. Andava esquisito,
vendo e ouvindo pessoas que identificava como soldados ou policiais andando em
volta da casa, o que acontecia algumas vezes ao dia e vinha alterando sua vida
diurna e noturna, com perturbação do hábito do sono.
Sua
esposa informou que perambulava inquieto pela casa, deitava tarde e acordava
cedo, alternando esse comportamento com períodos de sonolência intensa à tarde
e prostração.
Estava
emagrecendo e apresentava constipação intestinal, obrigando-o ao uso de
laxantes.
A
esposa temia que não se recuperasse.
Fui a sua casa por solicitação dela e o encontrei semideitado
em seu quarto. Recebeu-me com cortesia e acolhimento, demonstrando que eu
estava sendo aguardado. Logo, começou a contar a história da cirurgia em
minúcias. A relatou duas vezes quase com as mesmas palavras. Entendi que estava
assustado com a mesma, entendimento que me auxiliou a ter paciência e
tolerância para continuar ouvindo-o por uma hora.
Disse-lhe
que precisava, ir mas prometi que voltaria. Surpreendeu-me o vigor físico com
que se levantou da cama, seu olhar fixo em mim e o convite para conhecer sua
casa. Chamou minha atenção essa súbita manifestação de intimidade. Aceitei o
convite. Depois voltou ao quarto e nos despedimos.
Prescrevi olanzapina-10 mg ao dia e clonazepam 1 mg duas
vezes ao dia. Meu diagnóstico inicial foi de EF e THB. Diante da receptividade
do paciente, propus aos familiares uma psicoterapia uma vez por semana.
Combinei o retorno, conforme acordado com o paciente, para a semana seguinte,
no mesmo dia e mesmo horário, convencido pela minha formação de analista que
esta regularidade era importante. Era
uma quarta-feira.
Ocorrência do surto psicótico
Na véspera de meu retorno, na noite de terça-feira, sua
esposa telefona, porque naquele momento M estava agitado. Dizia que só tomaria
o remédio com a esposa. Olhava-a e referia-se a ela como uma mulher
desconhecida, que havia entrado em seu quarto. Lá permanecera, incomodando-o
com sua presença, em busca de um contato sexual. M exigia que chamassem a
polícia para retirá-la.
Pouco
depois liga para informar que M dormira com o clonazepan e não era necessário
eu ir até ele. Não o entendi de imediato esse surto.
No dia seguinte, fui vê-lo. Ela contou que dormiu a noite
toda e acordou menos confuso e agitado. Havia passado bem a semana, dormindo
sem sobressaltos com o quadro alucinatório dos soldados e dos policiais. Estava
alimentando melhor e o funcionamento intestinal melhorou. Disse-me que, no dia
anterior ao surto, M levantou bem sem apresentar sintomas delirantes.
Relacionei,
então, o surto à véspera do meu retorno. Podia estar revelando uma ambivalência
em relação a mim de ser cuidado e de me afastar dele.
Dirige-me a M, que acabava de acordar. Cumprimentou-me
amistosamente e queria falar sobre o acontecimento recente. Contou com absoluta
certeza e em detalhes a entrada da mulher no quarto em busca de sexo,
aproveitando ida da sua mulher ao hospital para ver o filho. Relatou que a mulher se deitou ao seu lado na
cama. Repetiu várias vezes que não houve contato físico e que estava aliviado,
porque os familiares compreenderam o sucedido sem lhe fazer nenhuma reprovação.
Eu lhe
disse-lhe que sim. Eu e seus familiares estávamos ao seu lado. Despedimos em
seguida.
Esbocei, então, uma compreensão em relação a sua
sintomatologia psicótica e suas quedas ao chão. Estava em estado físico e
psíquico precário e tinha medo de ficar sozinho.
Esse
entendimento foi importante para eu compreender que minha relação com ele era
vital.
Contudo,
ainda não possuía a dimensão real dessa importância para ele no seu estado
físico e psíquico, como se verá adiante.
Evolução clínica
M foi melhorando e três meses depois do início, eu suspendi a
olanzapina. Manteve-se bem por oito meses, sem sintomas psicóticos e estava
mais afetivo. Voltou a sair acompanhada da esposa, não mais caiu ao solo e fez
uma viagem de férias por dez dias. Sua vida retornava à regularidade.
Após esse período, como de costume voltei à sua casa na
quarta-feira. Recebeu-me com cordialidade. Levou-me até a sala de visitas, ao
contrário de antes, quando me recebia na antessala, onde nós sentávamos.
Comentou sobre suas amizades antigas. Próximo do final do encontro convidou-me
para tomar café com ele. O inusitado do convite deixou-me embaraçado e
disse-lhe que aceitaria na outra quarta-feira. Não me ocorreu nem mesmo uma só
desculpa razoável. Não aceitar o convite foi desastroso.
Dois dias depois, sua esposa me telefona a noite, para dizer
que M havia piorado. Estava prostrado e não dormia. Não queria atrapalhar meu
fim de semana, mas queria saber o que fazer. Ainda assim, disse-lhe que iria
vê-lo. Não concordou.
Na
segunda-feira cedo, a esposa solicitou a antecipação da minha presença.
Ao chegar, encontrei-o assentado, prostrado, cabisbaixo,
quase imóvel. Com um olhar sem brilho, não conseguia levantar nem a cabeça para
cumprimentar ou fazer uma saudação. Estava metamorfoseado. Logo relacionei esta
piora à minha recusa ao seu convite para tomar o café.
A piora deixou-me incomodado. Certamente M se sentira
indesejado e desamparado após a não aceitação do convite, o que não
correspondia à realidade, pois era grande meu zelo por ele.
Senti-me mal, nesse momento crucial para ele, quando mais
precisava da minha convicção de que poderia ajudá-lo.
M foi internado e submetido a inúmeros exames radiológicos e
laboratoriais. Dois dias depois, saiu do quadro de prostração e passou a
apresentar agitação. Foi medicado com Haldol 5mg duas vezes ao dia e 25 mg de
Amplictil ao deitar. Ainda assim, apresentou poucas melhoras.
Os
exames realizados não revelaram a existência de qualquer causa orgânica. O
clínico e o neurologista se afastaram.
Inteirei-me que eu havia sido o agente central da piora de M
e pude considerar minha recusa como um trauma para ele. Produzira uma ferida
psíquica, por onde vazou tudo o que havíamos conseguido em termos de segurança
consistente para M.
Mediquei-o, outra vez com a olanzapina e passei a atendê-lo
duas vezes por semana. Voltou a melhorar
e a apresentar momentos de choro e afetividade com os filhos. Parecia estar-se
recuperando.
Semanas depois, apresenta outro delírio. Insistia tanto que
desejava voltar à casa antiga, que precisou ser contido. O portão da casa teve
de ser trancado com cadeado. Entendi esse delírio como expressão do desejo de
voltar a sentir como era antes de adoecer. Era uma manifestação clínica que já
observara em outros pacientes e que eu relacionava a algum tipo de melhora.
Novamente, M desejava voltar ao mundo dos vivos. O delírio perdurou por algum
tempo e desapareceu espontaneamente.
Ainda continuei atendendo-o por mais dois anos, agora de
forma mais espaçada e com uso apenas de tranquilizante até que foi suspendido o
tratamento.
Meu diagnostico para este paciente é de TEPT decorrente da
aposentadoria precoce e da craniectomia.
Em geral, esses pacientes falam pouco sobre si e a vida
pessoal e não relatam sonhos. Assim como foi com meu paciente, fica impossível
reconstruir sua história pessoal e ouvir dele relato de alguma experiência
considerada por ele como traumática.
Tratamento
A - Benzodiazepinícos
B - Antidepressivos
C - Antipsicóticos
D - Psicoterapia
E - Acumpultura
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