domingo, 22 de novembro de 2015

TRANSTORNO DE ESTRESSE PÓS TRAUMÁTICO





INTRODUÇÃO



O Transtorno de stress pós-traumático (TEPT) está relacionado a um evento traumático, como vítima ou testemunha com noção de morte, que gera uma resposta fisiológica intensa que perdura por mais de um mês e que haja uma predisposição.
Os estudos iniciais datam de 1936 e foram feitos por Hans Selye. Descreveu a Síndrome de Adaptação Geral com três fases: alarme, resistência e exaustão. Foram retomados de forma mais marcante após os acidentes com os atentados de 2001 contra o World Trade Center, o tsunami na Tailândia em 2004, o furacão Katrina em 2005 e o pós-guerra do Iraque, Afeganistão e Paquistão.
O termo estresse foi tirado da física para denotar um estado do motor de um avião que não pode mais voar devido ao desgaste do motor.
Envolve uma condição de exaustão física e psíquica. Geralmente seu portador se esforça por continuar devido a críticas de terceiros e de si mesmo para consigo, se esforçando para a realização de suas tarefas físicas e psíquicas. Esse esforço continuado, como se tivesse empurrando um carro na subida, leva-o a exaustão.
                O trauma pode ser decorrente de um acidente de carro, um diagnóstico médico grave, uma cirurgia, um assalto, um sequestro, uma tortura física ou mental, uma separação traumática, uma perda de ente querido e outros.

Diagnóstico
A. Sonhos traumáticos repetitivos;
B. Flashbacks de lembranças traumáticas intrusivas na vida diurna;
C. Afastamento de estressores ambientais anteriores e novos.
               Sintomas secundários: baixa da imunidade, lentidão de raciocínio, perda de memória, lacunas de pensamento, falta de concentração, distúrbios do sono, constipação intestinal, diminuição da libido, andar lento, fala lenta, desfalecimentos, medo de ficar só ou de sair de casa. Ocasionalmente aparecem sintomas de excitação e psicóticos.
Esses últimos podem levar a erros de diagnostico, como Esquizofrenia e TDH.

Epidemiologia
Estima-se que 50–60% das pessoas irão passar por uma experiência traumática como as descritas e que 8% irão desenvolver o TEPT. Tenho minhas discordâncias diante da frequência desses pacientes em meu consultório, geralmente com diagnósticos de depressão refratária, Transtorno de atenção e Transtorno de humor bipolar.

Predisposição
               Conclusão: um trauma anterior é necessário para o desenvolvimento do TEPT.
               Stress Disorders, Post-Traumatic Arch Gen Psychiatry 2008; 65(4):431-7.

Patogenia
Uma abordagem da neurociência para entender o TEPT e a predisposição
Estudos mostram duas áreas do cérebro sensíveis ao estresse: o hipocampo, importante para a memória e o córtex pré-frontal, envolvido no raciocínio e tomada de decisão. A ressonância magnética funcional, que monitora o fluxo de sangue no cérebro, revelou que, quando as pessoas que têm TEPT são lembrados do trauma, elas tendem a ter um córtex pré-frontal desativado e uma amígdala hiperativa.
As pessoas que sofrem de trauma, mas não desenvolvem TEPT, por outro lado, mostram atividade maior do córtex pré-frontal. Estudos mostraram que esses indivíduos resilientes têm conexões físicas mais fortes entre o córtex e o hipocampo. Isto sugere que a resiliência depende em parte de comunicação entre o circuito de raciocínio no córtex e o circuito emocional do sistema límbico.
               Stress Disorders, Post-Traumatic Neuron 2008;56(1):19-32.

Caso clínico
M era professor universitário aposentado e havia dirigido vários órgãos públicos. Foi sempre ativo e enérgico. Estava com 67 anos.
Dois anos após a aposentadoria começou a apresentar tremores dos dedos das mãos, espasmos ocasionais da musculatura estriada da face, sintomas de depressão sem antecedentes na história pessoal e quedas repetidas ao solo sem perda da consciência.
O neurologista fez o diagnóstico de Parkinson, mas não encontrou explicação para as quedas ao solo, apesar da completa propedêutica neurológica.
Após uma dessas quedas, foi detectado um hematoma na região occipital e submetido a craniectomia.
Três meses depois continuava com as quedas ao solo, tornou-se estranho com os familiares e com o trato com dinheiro. Só gastava o necessário e não confiava no banco, onde deixava o mínimo de dinheiro. Andava esquisito, vendo e ouvindo pessoas que identificava como soldados ou policiais andando em volta da casa, o que acontecia algumas vezes ao dia e vinha alterando sua vida diurna e noturna, com perturbação do hábito do sono.
Sua esposa informou que perambulava inquieto pela casa, deitava tarde e acordava cedo, alternando esse comportamento com períodos de sonolência intensa à tarde e prostração.
Estava emagrecendo e apresentava constipação intestinal, obrigando-o ao uso de laxantes.
A esposa temia que não se recuperasse.
Fui a sua casa por solicitação dela e o encontrei semideitado em seu quarto. Recebeu-me com cortesia e acolhimento, demonstrando que eu estava sendo aguardado. Logo, começou a contar a história da cirurgia em minúcias. A relatou duas vezes quase com as mesmas palavras. Entendi que estava assustado com a mesma, entendimento que me auxiliou a ter paciência e tolerância para continuar ouvindo-o por uma hora.
Disse-lhe que precisava, ir mas prometi que voltaria. Surpreendeu-me o vigor físico com que se levantou da cama, seu olhar fixo em mim e o convite para conhecer sua casa. Chamou minha atenção essa súbita manifestação de intimidade. Aceitei o convite. Depois voltou ao quarto e nos despedimos.
Prescrevi olanzapina-10 mg ao dia e clonazepam 1 mg duas vezes ao dia. Meu diagnóstico inicial foi de EF e THB. Diante da receptividade do paciente, propus aos familiares uma psicoterapia uma vez por semana. Combinei o retorno, conforme acordado com o paciente, para a semana seguinte, no mesmo dia e mesmo horário, convencido pela minha formação de analista que esta regularidade era importante.  Era uma quarta-feira.

Ocorrência do surto psicótico
Na véspera de meu retorno, na noite de terça-feira, sua esposa telefona, porque naquele momento M estava agitado. Dizia que só tomaria o remédio com a esposa. Olhava-a e referia-se a ela como uma mulher desconhecida, que havia entrado em seu quarto. Lá permanecera, incomodando-o com sua presença, em busca de um contato sexual. M exigia que chamassem a polícia para retirá-la.
Pouco depois liga para informar que M dormira com o clonazepan e não era necessário eu ir até ele. Não o entendi de imediato esse surto.
No dia seguinte, fui vê-lo. Ela contou que dormiu a noite toda e acordou menos confuso e agitado. Havia passado bem a semana, dormindo sem sobressaltos com o quadro alucinatório dos soldados e dos policiais. Estava alimentando melhor e o funcionamento intestinal melhorou. Disse-me que, no dia anterior ao surto, M levantou bem sem apresentar sintomas delirantes.
Relacionei, então, o surto à véspera do meu retorno. Podia estar revelando uma ambivalência em relação a mim de ser cuidado e de me afastar dele.
Dirige-me a M, que acabava de acordar. Cumprimentou-me amistosamente e queria falar sobre o acontecimento recente. Contou com absoluta certeza e em detalhes a entrada da mulher no quarto em busca de sexo, aproveitando ida da sua mulher ao hospital para ver o filho.  Relatou que a mulher se deitou ao seu lado na cama. Repetiu várias vezes que não houve contato físico e que estava aliviado, porque os familiares compreenderam o sucedido sem lhe fazer nenhuma reprovação.
Eu lhe disse-lhe que sim. Eu e seus familiares estávamos ao seu lado. Despedimos em seguida.
Esbocei, então, uma compreensão em relação a sua sintomatologia psicótica e suas quedas ao chão. Estava em estado físico e psíquico precário e tinha medo de ficar sozinho. 
Esse entendimento foi importante para eu compreender que minha relação com ele era vital.
Contudo, ainda não possuía a dimensão real dessa importância para ele no seu estado físico e psíquico, como se verá adiante.

Evolução clínica
M foi melhorando e três meses depois do início, eu suspendi a olanzapina. Manteve-se bem por oito meses, sem sintomas psicóticos e estava mais afetivo. Voltou a sair acompanhada da esposa, não mais caiu ao solo e fez uma viagem de férias por dez dias. Sua vida retornava à regularidade.
Após esse período, como de costume voltei à sua casa na quarta-feira. Recebeu-me com cordialidade. Levou-me até a sala de visitas, ao contrário de antes, quando me recebia na antessala, onde nós sentávamos. Comentou sobre suas amizades antigas. Próximo do final do encontro convidou-me para tomar café com ele. O inusitado do convite deixou-me embaraçado e disse-lhe que aceitaria na outra quarta-feira. Não me ocorreu nem mesmo uma só desculpa razoável. Não aceitar o convite foi desastroso.
Dois dias depois, sua esposa me telefona a noite, para dizer que M havia piorado. Estava prostrado e não dormia. Não queria atrapalhar meu fim de semana, mas queria saber o que fazer. Ainda assim, disse-lhe que iria vê-lo. Não concordou.
Na segunda-feira cedo, a esposa solicitou a antecipação da minha presença. 
Ao chegar, encontrei-o assentado, prostrado, cabisbaixo, quase imóvel. Com um olhar sem brilho, não conseguia levantar nem a cabeça para cumprimentar ou fazer uma saudação. Estava metamorfoseado. Logo relacionei esta piora à minha recusa ao seu convite para tomar o café.
A piora deixou-me incomodado. Certamente M se sentira indesejado e desamparado após a não aceitação do convite, o que não correspondia à realidade, pois era grande meu zelo por ele.
Senti-me mal, nesse momento crucial para ele, quando mais precisava da minha convicção de que poderia ajudá-lo.
M foi internado e submetido a inúmeros exames radiológicos e laboratoriais. Dois dias depois, saiu do quadro de prostração e passou a apresentar agitação. Foi medicado com Haldol 5mg duas vezes ao dia e 25 mg de Amplictil ao deitar. Ainda assim, apresentou poucas melhoras.
Os exames realizados não revelaram a existência de qualquer causa orgânica. O clínico e o neurologista se afastaram.
Inteirei-me que eu havia sido o agente central da piora de M e pude considerar minha recusa como um trauma para ele. Produzira uma ferida psíquica, por onde vazou tudo o que havíamos conseguido em termos de segurança consistente para M.
Mediquei-o, outra vez com a olanzapina e passei a atendê-lo duas vezes por semana.  Voltou a melhorar e a apresentar momentos de choro e afetividade com os filhos. Parecia estar-se recuperando.
Semanas depois, apresenta outro delírio. Insistia tanto que desejava voltar à casa antiga, que precisou ser contido. O portão da casa teve de ser trancado com cadeado. Entendi esse delírio como expressão do desejo de voltar a sentir como era antes de adoecer. Era uma manifestação clínica que já observara em outros pacientes e que eu relacionava a algum tipo de melhora. Novamente, M desejava voltar ao mundo dos vivos. O delírio perdurou por algum tempo e desapareceu espontaneamente.
Ainda continuei atendendo-o por mais dois anos, agora de forma mais espaçada e com uso apenas de tranquilizante até que foi suspendido o tratamento.

Meu diagnostico para este paciente é de TEPT decorrente da aposentadoria precoce e da craniectomia.
Em geral, esses pacientes falam pouco sobre si e a vida pessoal e não relatam sonhos. Assim como foi com meu paciente, fica impossível reconstruir sua história pessoal e ouvir dele relato de alguma experiência considerada por ele como traumática.

Tratamento
   A - Benzodiazepinícos
   B - Antidepressivos
   C - Antipsicóticos
   D - Psicoterapia
   E - Acumpultura

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